7.31.2009
Já só falta descobrir duas
Caminhos
7.30.2009
Simplesmente...
7.29.2009
Free
Núvem
locuções de um pensamento aberto. No vazio de tudo
eram frontes do universo deslumbrantes.
Em silêncio via-as deslizar num gozo obscuro
e luminoso, tão suave na visão que se dilata.
Que clamor, que clamores mas em silêncio
na brancura unânime! Um sopro do desejo
que repousa no seio do movimento, que modela
as formas amorosas, os cavalos, os barcos
com as cabeças e as proas na luz que é toda sonho.
Unificado olho as nuvens no seu suave dinamismo.
Sou mais que um corpo, sou um corpo que se eleva
ao espaço inteiro, à luz ilimitada.
No gozo de ver num sono transparente
navego em centro aberto, o olhar e o sonho
7.28.2009
Garfos de fome
7.27.2009
Ninguém me faz o tempo olhar para trás
7.26.2009
7.25.2009
Aqui, agora
Tinha um álbum fotográfico onde moravam apenas uma foto e uma única frase das pessoas de quem gostava muito. Escolhia-as minuciosamente, algumas apenas após muito tempo, para tentarem espelhar, de forma mais fiel, como as via. Captadas na lúcida certeza do preto e branco, guardadas preciosamente, contrastando com o vermelho sangue, da capa rígida oriental que as protegia das suas saudades. Não tinha, por lá, muitas, curiosamente [ainda] nenhuma foto tua. Guardava-a num álbum que fizera apenas teu: nos pensamentos. Nos olhos fechados via-a nítida como a via no escuro, num suspiro adiado, sem ser preciso uma foto ou uma única palavra, para a ver, para a querer. Aqui. Agora.
7.24.2009
7.23.2009
Extenso mas perfeito
7.22.2009
O pecado mora tão perto
7.21.2009
Alice
7.20.2009
Moon Walker
7.19.2009
7.18.2009
Repouso
ou porque chegas sempre em não chegares.
Subi um dia por uma escada silenciosa
e em torno era um pomar branco, tranquila maravilha
e eu senti, eu vi, adivinhei
a divindade amada, a soberana e delicada
majestade. Que suavidade de oriente,
que suave esplendor! Era o fulgor de um sono
límpido, entre olhos verdes, entre mãos verdes.
E num repouso de oiro adormecido era quase um rosto
Antiquíssimo e inicial. Contemplava
a quietude de um imenso nenúfar
e a fragância era quase visível como um mar entreaberto.
Era um rio detido ou uma tersa nuca ou um braço estendido
que descansa entre ribeiros primaveris
ou era antes a serena felicidade
e era uma boca da terra que não cantava que não dizia
o silêncio ardente que no peito de espuma cintilava.
7.17.2009
Taited Love #7
Steve Forney, EUA (??? - ???)
A arte do desenho e da ilustração. Para tantos uma arte menor. Discordo. Condensas a simplicidade em traços encantados. Numa minúcia minimalista. Com alma. Ganhando uma aura subtil. Glamourosa.
O ilustrador freelancer que desenha desde que se lembra. Coisas. Viagens. Lugares. O ilustrador de imagens sonhadas de quem gosto, também, desde que te conheci.
7.16.2009
Mãos (sem título)
7.15.2009
Apetece-me escrever
Apetece-me escrever. Uma ebulição de coisas soltas que gravitam. Aqui, acolá, vindas não sei se de dentro, se do exterior de mim. Apetece-me escrever mas não consigo. Adio-o. Adiando o inadiável, enquanto um mar de coisas cresce, a bater nas minhas paredes
Apetece-me escrever mas não sei como. Escrever como nunca escrevi. Escrever duas histórias entrelaçadas, numa só. Duas histórias talvez ainda sem história. Talvez ainda por descobrir o caminho. Duas histórias procurando-se nas folhas escritas. Escritas de uma forma diferente. Com a voracidade de um incêndio. Escritas do inicio para o fim, do fim para o princípio, para os lados, com muitos parêntesis para recuperar o fôlego, com muitas histórias dentro das próprias histórias. Com frases e imagens recorrentes como um eco ou uma música. Duas histórias a galope. Famintas de encontro. Famintas de tempo. Um tempo cujo pêndulo do relógio se imobilizou, ampliando as coisas e os sentidos.
Apetece-me escrever no meio do mar, nadar para longe, para lá da rebentação. Nadar até me faltarem as forças e ficar por ali, sentindo o cansaço e o ondular do corpo. Aguardando o assentar das coisas, numa aberta de sol que entretanto se fez, curiosa talvez. Pode ser que aí encontre essa escrita. Pode ser que aí me encontres, também. Pode ser que aí te consiga escrever.
7.14.2009
Seda
Não tenhas medo, não te mexas, fica em silêncio, ninguém nos verá.
Fica assim, quero olhar para ti, olhei-te muito mas não eras para mim, agora és para mim, não te aproximes, por favor, fica como estás, temos uma noite para nós e eu quero olhar para ti, nunca te vi assim, o teu corpo para mim, a tua pele, fecha os olhos, e acaricia-te, por favor, não abras os olhos se puderes, e acaricia-te, são tão bonitas as tuas mãos, sonhei com elas tantas vezes, agora quero vê-las, gosto de as ver na tua pele, assim, por favor, continua, não abras os olhos, eu estou aqui, ninguém nos pode ver e eu estou ao pé de ti, acaricia-te […], acaricia o teu sexo, peço-te, devagar, é bonita a tua mão no teu sexo, não pares, eu gosto de olhar para ela e de olhar para ti, […], não abras os olhos, ainda não, não tenhas medo, estou perto de ti, sentes-me? Estou aqui, posso aflorar-te, isto é seda, sentes?, é a seda do meu vestido, não abras os olhos e terás a minha pele, terás os meus lábios, quando te tocar pela primeira vez será com os meus lábios, tu não saberás onde, a determinada altura sentirás o calor dos meus lábios, sobre ti, não podes saber onde se não abrires os olhos, não os abras, sentirás a minha boca onde não sabes, de repente, talvez seja nos teus olhos, apoiarei a minha boca nas pálpebras e nas pestanas, sentirás o calor entrar na tua cabeça, e os meus lábios nos teus olhos, dentro, ou talvez seja no teu sexo, apoiarei os meus lábios, lá em baixo, e descerrá-los-ei descendo pouco a pouco, deixarei que o teu sexo entreabra a minha boca, entrando entre os meus lábios e empurrando a minha língua, a minha saliva descerá ao longo da tua pele até à tua mão, o meu beijo e a tua mão, um dentro do outro, no teu sexo, até que finalmente te beijarei o coração, porque te quero, e com o coração entre os meus lábios tu serás meu, de verdade, com a minha boca no coração tu serás meu, para sempre, se não acreditas em mim abre os olhos […] e olha para mim, sou eu, quem poderá alguma vez apagar este instante que acontece, e este meu corpo sem mais seda, as tuas mãos que lhe tocam, os teus olhos que olham para ele. Os teus dedos no meu sexo, a tua língua nos meus lábios, tu a deslizar debaixo de mim, pegas nas minhas ancas, levantas-me, deixas-me deslizar sobre o teu sexo, devagar, quem poderá apagar isto, tu dentro de mim mexendo-te devagar, as tuas mãos no meu rosto, os teus dedos na minha boca, o prazer dos teus olhos, a tua voz, mexes-te devagar mas até me magoar, o meu prazer, a minha voz, o meu corpo sobre o teu, as tuas costas a levantarem-me, os teus braços a segurarem-me, os golpes dentro de mim, é violência doce, vejo os teus olhos procurarem nos meus, querem saber até onde me podem magoar, até onde quiseres, […], não há fim, não acabará, vês? Ninguém poderá apagar este instante que acontece, para sempre atirarás a cabeça para trás, gritando, para sempre fecharei os olhos arrancando as lágrimas das minhas pestanas, a minha voz dentro da tua, a tua violência a manter-me agarrada, já não há tempo para fugir nem força para resistir, tinha de ser este instante, e este instante é, acredita em mim, […], este instante será, de agora em diante, será, até ao fim […]
7.13.2009
Silêncios
Hoje, desde que acordei, comovi-me com toda a espécie de repetições. […] Hoje, ao contrário de quase sempre, parece-me que há mais verdade no pessimismo dos velhos do que no optimismo dos adolescentes. Contra isto, acabei de fazer a barba. Não resultou. Utilizei o pincel para espalhar o creme, utilizei uma lâmina de barbear nova, tenho a pele lisa e morna, mas não resultou.
Nunca gostei de dizer “as minhas ex-mulheres” (duas). Não apenas pelo tom de Elizabeth Taylor que essa expressão confere a qualquer frase, mas sobretudo pelo facto das pessoas em questão não serem ex-nada, ambas continuam a ser o que são e, hoje, talvez até sejam bastante mais do que eram perto de mim.
É justo que mude de parágrafo para explicar que, da mesma maneira, não gosto de dizer “as minhas ex-namoradas” (não as contei). Nesse caso creio que a expressão induz um número enganadoramente elevado. […] Foi
Mudando outra vez de parágrafo, não tenho nada para chamar às pessoas com quem tive algo, nem sequer palavra para esse “algo”. Aquilo que sei com certeza é que, a haver um ex-qualquer-coisa, esse ex-tudo só posso ser eu. […] Esta enumeração poderia continuar com muita facilidade. É melhor pará-la porque, hoje, as repetições têm-me comovido desde que acordei. […]
Hoje, agora, barba feita e inútil, apenas quero dizer que […] gostava de ter a coragem de ser como aquele escritor americano que há cinco/seis anos conheci em Haia, na Holanda. Desde a hora em que fomos apresentados, ele sentiu uma ternura instantânea e evidente por mim, uma ternura paternal, que aceitei. Era de noite, caminhávamos pelas ruas desertas de Haia, chovia um véu que nos cobria o rosto.
Ele passava dos sessenta anos, eu ainda não tinha trinta, falava dos filhos que eram homens e lhe telefonavam duas ou três vezes por ano, falava-me da solidão. Disse-me que estava sozinho há quase quinze anos. Quando lhe perguntei o motivo pelo qual não procurava companhia, respondeu-me que não queria fazer mal a mais ninguém. Essas palavras ficaram-me, ouço-as muitas vezes.
Nessa noite enquanto passeávamos, o escritor americano tropeçou e caiu com muita violência no chão, as mãos escorregaram-lhe quando ia para amparar a queda. Tentei ajudá-lo a levantar-se, recusou. Perguntei-lhe se devia chamar uma ambulância, recusou. Disse-me que só precisava de ficar deitado durante um instante. E assim foi. Ficou deitado no passeio, de barriga para cima, de olhos fechados, com a chuva a cobri-lo devagar. Eu baixei-me e fiquei ao seu lado. Durante esse instante, no silêncio, dentro da dor, houve paz.
José Luís Peixoto
7.12.2009
Quarto com vista sobre a cidade (adormecida)
7.11.2009
O teu corpo (num dia perfeito)
O teu corpo é um mar que vai e vem na maré das minhas mãos. É um jardim vivo, encantado, plantado em terra que faz mudar a cor das árvores e dos meus olhos. Por cujos ramos subo, suspenso, a pairar com os sentidos atentos, na frescura da pele, num cheiro de framboesa perfumado em chocolate que desconcentra e embriaga os lábios.
O teu corpo é uma janela rasgada para dentro, onde te sinto, por inteira, numa fala calada e descansam os olhos outrora aflitos. Onde se prolonga o calor de um sorriso infinito num quente frio que se cola à pele agarrado pelas mãos perdidas.
O teu corpo é um acidente iminente, com curvas de rotunda. Elípticas, prolongando o tempo. Deixando um atordoar de luz de lua oscilante que atrai um gato para o meio da estrada, embalado por uma música perfeita.
O teu corpo é uma fita do bonfim quebrada por beijos húmidos. De desejos impossíveis, dos que valem realmente a pena, ofuscando tudo, ao redor, até a vista da cidade adormecida.
O teu corpo é um farol que passou a brilhar nos meus olhos fechados num ponto que baptizaste estrela e que ninguém nos tirará. É um aperto forte que apetece esvaziar sem largar mas sem quebrar. Que apetece morder. O teu corpo és tu comigo num dia perfeito. És tu a viajar em mim. O teu corpo és tu a dormir em mim, algures pelo meu sangue.
Acho o teu corpo assombrosamente perfeito, mas afinal concordo contigo. Mudaria algumas pequenas coisas: juntar-lhe-ia o meu, moldando-se ao teu, na lividez desértica dos silêncios, libertando imagens que quase ferem, por entre suspiros suados e dedos-olhos-lambidos. Levitando num tempo estranho, mais lento e demorado, lembrando que apenas uma parte dos corpos nos pertence, sendo a outra entregue, partindo, numa viagem, algures dentro de mim, dentro de ti.