6.25.2010

Infinito fim


Toranja, Fim

A mercearia de bairro encerrou [ou faz, talvez, uma pausa prolongada].
A todos o meu sincero obrigado e até um destes dias [por aqui ou, algures, por aí...]

6.24.2010

Assim é a poesia

Não sei onde acordei, a luz perde-se ao fundo do corredor, longo, longo, com quartos dos dois lados, um deles é o teu, demoro muito a chegar lá, os meus passos são de menino, mas os teus olhos esperam-me com tanto amor, tanto que corres ao meu encontro com medo de tropeçar no ar - ò musicalíssima.

Eugénio de Andrade

6.23.2010

Tatuagem de sol

Há cabelos teus e silêncios, espalhados pela casa. Brilhos moídos das searas que deixaste ligadas por pontes e marés, que sussuram o teu nome na pele, como um sol, tatuado nos meus dias.

6.22.2010

Au revoir

Irlandeses, esperam a equipa de futebol Francesa, em Charles de Gaule, para perguntarem com a devida solidariedade: Vai uma "mãozinha"?

6.21.2010

Ternura amarrotada

Desvio dos teus ombros o lençol,
que é feito de ternura amarrotada,
da frescura que vem depois do sol,
quando depois do sol não vem mais nada...

Olho a roupa no chão: que tempestade!
Há restos de ternura pelo meio,
como vultos perdidos na cidade
onde uma tempestade sobreveio...

Começas a vestir-te, lentamente,
e é ternura também que vou vestindo,
para enfrentar lá fora aquela gente
que da nossa ternura anda sorrindo...

Mas ninguém sonha a pressa com que nós
a despimos assim que estamos sós!

David Mourão-Ferreira

6.20.2010

Saudades

Entram devagar, sem avisar - as tuas saudades. Descem com os pés frios e põem a perna sobre o meu corpo. Prendem-no, embalam-no, abraçam-me. Instalam-se, a pentear cabelos e a navegar no meu rosto, num silêncio nocturno.

Duas luas de jade irrompem magnéticas do escuro, dançam como o mar e misturam-se nos meus olhos. Inundam-nos do teu sorriso, do teu calor e dão-lhes as mãos. Resgatam-nos para outro tempo, para outro lugar - coordenadas mágicas que fizemos só nossas.

Os teus lábios desabotoam, com pressa, as roupas espalhadas, preservando o calor, na calma das conversas infinitas, que se prolongam até a noite nos sussurrar o sono entrelaçado.

Entram devagar, sem avisar - as tuas saudades - e estão aqui comigo. Tu comigo, aqui, agora.

6.18.2010

Esquinas de mar

Escolhe-se uma varanda, acende-se um cigarro e levita-se para lá das nuvens, para lá da lua, mergulha-se para lá do tempo, para lá de nós. O mundo parece tão pequeno, insuficiente, as perspectivas transforma-se e fica-se mais leve, mais lesto, mais ausente. Vê-se a vida em câmara lenta. Recordam-se cheiros e imagens, fragmentos guardados e esquecidos, alguns que passaram despercebidos, outros sempre presentes, apenas à espera de um braço para os puxar. Tudo noutra velocidade, noutro tempo. Um oceano infinito inunda-nos e deixamo-nos viajar em movimentos de anémonas. O próximo parece longe, o distante uma sombra das nossas vontades, ainda imóveis, por descobrir. O mar também tem esquinas, mas sempre será vasto e cantará ao ouvido os seus caminhos.

6.17.2010

Stop for a minute


Kean feat K'Naan, Stop for a minute



[ And if I stop for a minute
I think about things I really don't wanna know
And I'm the first to admit it
Without you I'm a liner stranded in an ice floe ]


Não adormeças nunca de mim

Não adormeças: o vento ainda assobia no meu quarto
e a luz é fraca e treme e eu tenho medo
das sombras que desfilam pelas paredes como fantasmas
da casa e de tudo aquilo com que sonhes.

Não adormeças já. Diz-me outra vez do rio que palpitava
no coração da aldeia onde nasceste, da roupa que vinha
a cheirar a sonho e a musgo e ao trevo que nunca foi
de quatro folhas; e das ervas húmidas e chãs
com que em casa se cozinham perfumes que ainda hoje
te mordem os gestos e as palavras.

O meu corpo gela à míngua dos teus dedos, o sol vai
demorar-se a regressar. Há tempo para uma história
que eu não saiba e eu juro que, se não adormeceres,
serei tão leve que não hei-de pesar-te nunca na memória,
como na minha pesará para sempre a pedra do teu sono
se agora apenas me olhares de longe e adormeceres.

Maria do Rosário Pedreira

6.16.2010

Today & Everyday



Uma frase com asas

Abro um livro e leio-te uma frase devagar, resgatando-a para o teu mundo. Uma frase quer-se viva, agregadora de outras e é sempre diferente consoante o momento, contexto ou lugar, nunca será uma mera junção de palavras com silêncios. Assim, solta, despojada e desprotegida, uma frase pode facilmente morrer de frio, sem outra tua que a siga, abrace ou aqueça. Largo-ta, assim, como um pássaro, frágil mas precioso, guardado algum tempo nas minhas mãos para poder beber da minha boca, da minha alma. Para que te consiga entregar o calor dos gestos e a vontade de voar. Para que te pinte de mil cores o céu das tuas pálpebras fechadas. Para te pousar no ombro, enrroscar-te no rosto e cantar.

6.15.2010

Nos teus olhos


Madrugada, Only when you're gone


Despes-me com as palavras que guardas por detrás dos teus olhos. Não chego a perceber se as conheces bem ou se as afastas por um medo antigo qualquer, mas não preciso de ouvir a tua boca para te sentir. Dela, emanas os seus ecos frágeis e brilhos infinitos, no rasto húmido de um beijo ou num toque de mãos demoradas, que deixam velas acesas pelo corpo quando te vais. Não me canso de olhar para ti. Falamos sempre tanto. Tanto, sem nada precisarmos de dizer.

6.14.2010

Tempo em que se morre

Agora é Verão, eu sei.
Tempo de facas, tempo
em que se perdem os anéis
as cobras à mingua de água.
Tempo em que se morre
de tanto olhar os barcos.

É no Verão, repito.
Estás sentada no terraço
e para ti correm todos os meus rios.
Entraste pelos espelhos:
mal respiras.
Vê-se bem que já não sabes respirar,
que terás de aprender com as abelhas.

Sobre os gerânios
te debruças lentamente.
Com o rumor de água
sonâmbula ou de arbusto decepado
dás-me a beber
um tempo assim ardente.

Pousas as mãos sobre o meu rosto,
e vais partir,
sem nada dizer,
pois só quiseste despertar em mim
a vocação do fogo ou do orvalho.

E devagar, sem te voltares
pelos espelhos entras na noite acesa.

Eugénio de Andrade

6.02.2010

Uma pessoa

Uma pessoa é uma pessoa diferente para cada um. Uma pessoa são muitas pessoas juntas numa só. Uma pessoa vai sendo várias pessoas ao longo do tempo e por vezes tem dificuldade em se reconhecer naquilo que foi. Fecha os olhos e vê-se detido no passado e fica espantado de se ver ali naquela companhia, naquele sítio, a fazer o que já nem sabe como.


Pedro Paixão

6.01.2010

Assíduos do shaker

LinkWithin

Blog Widget by LinkWithin