1.21.2008

A incerteza da demência

"Se me esquecer de ti, Jerusalém que seque a minha mão direita"


Em que é que está a pensar meu caro?
Em que é que está a pensar? A resposta verdadeira a esta questão apenas poderia ser conhecida pelo próprio, não havia partilha possível. Todos podiam mentir e portanto todos podiam estar seguros. No entanto, o assustador dessa pergunta era o oposto: nenhum dos doentes poderia provar que dizia a verdade. Como provar que se está a pensar num determinado assunto? O Doutor Gomperz só poderia acreditar, aceitar como verdadeiro, sem prova.
Assim, em última análise, a cura completa, que depois de ter passado pelos actos do doente terminava nos pensamentos, era determinada por um evidente puro arbítrio. Gomperz teria que acreditar que o doente dizia a verdade sobre os seus pensamentos, e que portanto não pensava em nada perigoso ou fora do normal; fixava-se assim em assuntos úteis e concretos.
No doutor Gomperz havia ainda uma espécie de moralismo mínimo infiltrado nos seus julgamentos sobre o estado do doente. Gomperz por vezes atrevia-se mesmo a colocar a um paciente a seguinte questão: sabes em que deves pensar? Tal como o professor de matemática ou gramática, fazia uma pergunta concreta sobre um determinado conteúdo, Gomperz fazia esta pergunta como se o outro estivesse num exame e só existisse uma resposta certa. Até para as pessoas saudáveis era perturbante.
Mesmo para Theodor Busbeck - habituado aos labirintos mentais em que doente e médico por vezes entravam - aquela pergunta era inaceitável, ou pelo menos ameaçadora.
Em que deve pensar um homem? Para onde deve o homem dirigir o seu pensamento?

Gonçalo M. Tavares in Jerusalém.


Sem dúvida um livro perturbante e surpreendente. Obrigado Joana, pelo despertar da curiosidade.

3 comentários:

Anónimo disse...

É sempre um prazer partilhar leituras:)

Dry-Martini disse...

Quero publicamente dizer que é a anónima menos indiferenciada que conheço. Uma espécie de aparição de Fátima. :) É sempre bem vinda, anónima ou não .)

Anónimo disse...

Apesar de ter muitas dúvidas relativamente aos milagres de Fátima, creio que seja de algum exagero comparar-me a Nossa Senhora!!!

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