6.26.2007

O limo da memória

Trovejava. De repente um relâmpago iluminou toda a sala, deixando qualquer ruído seguinte em suspenso. Ela olhou pela janela e tremeu, sentindo um arrepio de um suspiro misterioso passar-lhe imperceptivelmente pela memória. Percebeu que a janela do corredor estava entreaberta e, apesar do vento, os cortinados magicamente não mexiam. Estacou a dois milímetros e espreitou pela fresta, vendo um vulto de memória passar-lhe diante dos olhos.
Foi então que o vulto obscuro pareceu ganhar forma, como que a levitar com maior nitidez.
Materializou-se finalmente numa forma verde brilhante, a bailar ao vento. Um verde de infância, com sotaque inglês. “Ajude-me.”, dizia ele.
Era fino e escorregadio como um limo e piscava os olhos de pestanas douradas, muito rapidamente, atarantado. A cada pestanejar uma imagem formava-se na sua mente, surgindo diante dos seus olhos, imagens da sua própria vida, correndo em segundos pela sua cabeça, agora com significados que dantes não tinham.
Nem a chuva as distorcia. Nem a chuva, nem as lágrimas do vulto, que eram os écrans onde elas se espelhavam. Lágrimas e chuva misturadas em memórias, agora tão nítidas e aumentadas, como lupas do passado, que revelam tanto.
Todos somos espelhos do passado e há lágrimas que o tempo nunca apaga.


To be continued...


Em colaboração com Andrómeda

1 comentário:

Anónimo disse...

Lindo, muito.!
Lilaz

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