11.09.2008

Sibyl, a gecko butanesa

Calor húmido colado à pele. E um acordar sobressaltado. Um aviso. Um arrepio. Da janela aberta, a noite mansa. Calma. Eterna. E, ao longe, a Gangkhar Puensum, a mais alta montanha nunca escalada. O pico branco dos três irmãos espirituais.

Amanhã seria o dia. O dia em que a tentaria escalar. Em segredo, naquele país longínquo. Misterioso e proibido. A terra do Dragão. O dia em que talvez nunca regressaria. O último ou o primeiro de todos os dias.

Sentia uma presença no quarto. Camuflada mas intensa. Iluminada por um branco tépido de luar atento. Algo espiritual escorria pelo transpirar do corpo. Por entre o calor. E eis que te vi, suspensa, por entre as sedas exóticas. Quase imóvel.

Sibyl, a gecko butanesa, olhando-me fixamente com seu doce veneno. A invadir-me o sangue, nesse ópio de delírios recônditos. Milenares.

Ficámos assim, presos, não sei por quanto tempo. Numa espécie de fotografia roubada ao tempo. Num magnético contacto entre dois mundos, com a montanha de fundo. Que me quererias dizer Sibyl? Quem te enviara? Seriamos nós os três irmãos espirituais? Tu, eu e a montanha?

Nunca o saberei, mas mantenho a tua imagem perturbadora. De hábitos nocturnos. Deixando a presa indefesa. Imobilizando-me nos teus olhos de jade.

Parti cedo. Muito cedo. O tempo mudara. Nevava. Foi o dia mais frio do ano. E nunca mais vi Sibyl, a gecko butanesa.

1 comentário:

Anónimo disse...

Brilhante.

Sem mais palavras :)

Assíduos do shaker

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