9.23.2008

Os amantes

Começa o mar a castigar-te os flancos e a resumir, em poucos minutos, uma sonâmbula evolução de muitos milénios, convertendo em pedra o que era peixe, desfazendo em areia o que foi pedra, incorporando cada vez mais pó no volume das suas águas... Passam entretanto pelo céu nocturno cavalgadas de nuvens magnéticas; entre as estrelas mais longínquas estabelecem-se pactos efémeros; e morrem aves nos pântanos da Lua, sob a luz que da Terra lhe enviamos. Não sei se principias a gemer, se é lenha mais alto a crepitar. Luzes, Luzes! Luzes soltas no meio da escuridão... Instala-se o firmamento nas tuas entranhas. O êmbolo do vento acelera-te o ritmo. O teu último gemido, nem o consegues dominar: derrapou no pavor de ser um grito, suicida-se na curva do meu ombro. E finalmente deito-me a teu lado. Não sei se bem se a teu lado se dentro de ti.



David Mourão-Ferreira


Curioso, o sonho do mar a percorrer essa rocha delicada dos teus ombros...

1 comentário:

Noiva Judia disse...

o texto é excelente, mas a imagem não lhe fica nada atrás, pelo contrário. é fabulosa!

Assíduos do shaker

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