3.21.2008

Receita para juntar duas pessoas (impossíveis de juntar)

Ingredientes principais: verbo transitivo ou reflexo (juntar); substantivo masculino (impossível);
Ingredientes secundários (mas não menos importantes): personagem feminina; personagem masculina; esquina aguçada e grão de poeira;
Nível de dificuldade: Dificílimo (mas não impossível)
Modo de preparação:

A personagem (feminina, primeiro as senhoras) impossível de juntar caminha calmamente pela rua cinzenta, de betão. Estão a ver as dificuldades? Começam já aqui, no país da calçada portuguesa. Mas adiante. Caminha, num passo certo, quase metódico. Nem muito acelerando, nem muito lento. Atente-se, é importante o ritmo para que as claras não fiquem em castelo. Caminha nesse passo preciso, pelo piso meio molhado pela chuva que ameaça voltar (pois a massa está a ficar demasiado consistente). Pensa no novo filme que quer ver, depois do trabalho, no livro do sniper que ouviu falar, nos anjos de Lisboa, e no sotaque russo que parece ouvir daquela janela do primeiro andar. Tudo ao mesmo tempo, mexido lentamente.

A personagem (masculina) impossível de juntar caminha perpendicularmente e na sua direcção. Apressado (pois o recheio quer-se em ponto rebuçado). Volta para traz pois esqueceu-se duma coisa (que não revelo) na garagem – mais propriamente no carro. Avança contra a corrente sem grandes descrições (pois não o conheço, mas também não interessa nada pois dizem que os homens são todos iguais, mesmo os impossíveis de juntar). Apenas um pormenor: sapatos de sola.

As duas personagens (impossíveis de juntar) aproximam-se vertiginosamente da esquina aguçada (a mais afiada da região em homenagem à minha nova faca de sushi). Mesmo ao dobrar a esquina a chuva não se contem (lembrando que a massa já quase não se consegue mexer) e cai violentamente. É nesse preciso momento que entra a única especiaria da receita – o grão de poeira. A personagem feminina, na densidão cinzenta da rua, repara que a poeira tem um brilho mágico, nunca visto e fica especada a olhar para o chão, enquanto que a personagem masculina (devido talvez aos sapatos de sola) escorrega e desequilibra-se.

Talvez por ser uma receita (para juntar duas pessoas quase impossíveis de juntar) um pouco sigilosa e bastante invulgar, é a personagem masculina que cai nos braços da personagem feminina, levando-a também a juntar-se ao conforto de uma poça de água. Alguns puristas afirmam que a receita apenas é totalmente conseguida quando se consegue ler no reflexo da água “impossible is nothing” em tons brilhantes de poeira. Mas disso já não estou certo, talvez por ser um slogan publicitário e eu apenas perceber de receitas.


Para a minha amiga Sigourney. Espero que resulte .)

2 comentários:

Andrómeda disse...

Obrigada, Merlin :)
Adorei mesmo. Já se vê que tem jeito para receitas impossíveis.
Só de imaginar a cena já fico satisfeita :)

Dry-Martini disse...

Fico muito contente por si e também porque como sabe detesto impossíveis .)

XinXin

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