4.19.2007

Vela que se apaga na escuridão

Morrendo aos poucos. Deitado. Consciente. Sentia o peso do corpo como nunca sentira. Imóvel de tão pesado. Como que moldado ao chão num encaixe perfeito.
Esvaziando lentamente, como um aquário, vertendo água. Revelando a alma, lá no fundo. Outrora mais resguardada. Quase escondida. Agora, na crescente leveza, sentia-se numa nitidez nunca almejada.
Sem frio. Sem calor. Até à ausência de sentir do corpo. Dissipando o cansaço em redor.
Estivera tanto tempo preso neste corpo. Pensava. E agora, ao elevar-se como um balão de ar quente, sentia uma paz libertadora que não imaginara possível.
Não sabia o destino da sua derradeira viagem. Ele que as programara ao mais ínfimo detalhe em vida. Mas tal não o assustava. Apenas o preocupava o esquecimento. O perder a memória de momentos, pessoas, lugares que guardara ao longo do tempo, e que faziam parte de si.
Não sabia o que o esperava. Apenas contava com a chama das velas que perdiam, também, lentamente a cera, na escuridão.

1 comentário:

Lilazdavioleta disse...

Olá.!
Segundo dizem, quando se "parte" as memórias perdem-se, para voltar, depois, como um filme.
Assim como,quando se regressa, as mesmas voltam a ser perdidas, lentamente.
É, portanto, um processo "natural".

Assíduos do shaker

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