Acordou de um pesadelo profundo que teimava em não acabar. Onde cordeiros brancos passeavam nos vastos pastos das dúvidas eternas, saciando lobos famintos, sempre prontos a atacar. Afastando-os do seu olhar, para uma água tépida, sem pé, de planos quase indiferentes.
Percorrera noites sucessivas, sem dormir. Perdera-lhes a conta. Em busca do local secreto onde a lua se apagara. Um chamamento forte, desse brilho algures escondido, em mares nunca navegados, fazia-lhe festas na pele.
Nunca soube, no entanto, o que queria ao certo, e tivera tantas vezes à beira do abismo. De repente, num click sem razão aparente, como tantos desta vida, acordou num local que não era o seu. Apoderado duma mistura de felicidade e tristeza que se dissipavam agora, nítidas numa lenta dança de azeite na água.
Sentiu uma paz quente ao avistar, no alto, a lua pela janela, abraçando cansado o branco infinito da almofada. Amanhã é um novo dia.
6.29.2007
Click
6.28.2007
Sorriso perdido
6.27.2007
A escrita
No Palácio Mocenigo onde viveu sozinho
Lord Byron usava as grandes salas
Para ver a solidão espelho por espelho
E a beleza das portas quando ninguém passava
Escutava os rumores marinhos do silêncio
E o eco perdido de passos num corredor longínquo
Amava o liso brilhar do chão polido
E os tectos altos onde se enrolam as sombras
E embora se sentasse numa só cadeira
Gostava de olhar o vazio das cadeiras
Sem dúvida ninguém precisa de tanto espaço vital
Mas a escrita exige solidões e desertos
E coisas que se vêem como quem vê outra coisa
Pudemos imagina-lo sentado à sua mesa
Imaginar o alto pescoço espesso
A camisa aberta branca
O branco do papel as aranhas da escrita
E a luz da vela – como em certos quadros –
Tornando tudo atento
6.26.2007
O limo da memória
Foi então que o vulto obscuro pareceu ganhar forma, como que a levitar com maior nitidez.
Materializou-se finalmente numa forma verde brilhante, a bailar ao vento. Um verde de infância, com sotaque inglês. “Ajude-me.”, dizia ele.
Era fino e escorregadio como um limo e piscava os olhos de pestanas douradas, muito rapidamente, atarantado. A cada pestanejar uma imagem formava-se na sua mente, surgindo diante dos seus olhos, imagens da sua própria vida, correndo em segundos pela sua cabeça, agora com significados que dantes não tinham.
Nem a chuva as distorcia. Nem a chuva, nem as lágrimas do vulto, que eram os écrans onde elas se espelhavam. Lágrimas e chuva misturadas em memórias, agora tão nítidas e aumentadas, como lupas do passado, que revelam tanto.
Todos somos espelhos do passado e há lágrimas que o tempo nunca apaga.
To be continued...
6.25.2007
Palavras supérfluas
A cada encontro um pequeno texto. Sempre um pequeno texto. Simples. Complexo. Uma prosa. Um poema. Tanto fazia. Era esse o trato. O cumprimento. A curiosidade. Um condensar de palavras escolhidas meticulosamente e o seu prolongar no silêncio escuro. Como a ecoarem, absorvidas pelos poros sequiosos. Vibrando nas peles coladas, envoltas pelas luzes da cidade adormecida, em sôfregos beijos e quentes carícias.
Na despedida do olhar de sentidos o esgotar do som, guardado no desejo.
As palavras podem ser supérfluas.
6.24.2007
Parede de cal ao sol
Parede de cal ao sol. Era essa a tua luz. Quente ofuscar de fragilidade branca. Simples mas magnética. No teu caminhar descalço, sobre conchas, existiam marés de medo e desejo, que tentavas sempre dissipar em espuma, no azul do céu. Que véu me lançaste? Espessura invisível que me sufoca em odor de chuva. Secando. Brilhando. Numa parede de cal.
6.23.2007
6.22.2007
Bon appetite
6.21.2007
Reencontro
Miguel Torga
Ali estavam finalmente. Um reencontro nunca foi fácil quando tanto se quer.
Tantos anos. Tantos caminhos. Tantos encontros e desencontros. Alegrias e tristezas distantes, sem nunca se perderem nos labirintos da memória.
Ali estavam novamente. Olhos nos olhos, buscando feições perdidas, de outrora, à distância de um abraço. Já agarrados, num silêncio caloroso sobre os ombros, prolongado ao limite não disseram uma única palavra mas ecoou bem alto uma voz conjunta: envelhecemos bem mas tão depressa.
6.20.2007
O quarto em desordem
Derrapei neste amor. Que dor! Que pétala
Sensível e secreta me atormenta
E me provoca à síntese da flor
Que não se sabe como é feita: amor;
Na quinta-essência da palavra, e mudo
De natural silêncio já não cabe
Em tanto gesto de colher e amar
A nuvem que de ambíguo se dilui
Nesse objecto mais vago do que nuvem
E mais defeso, corpo! Corpo, corpo,
Verdade tão final, sede tão vária,
E esse cavalo solto pela cama,
A passear o peito de quem ama.
6.19.2007
Fake plastic tree
Her Green plastic watering can
For her fake Chinese rubber plant
In the fake plastic earth.
That she bought from a rubber man
In a town full of rubber plans.
to get rid of itself.
And It wears her out, it wears her out
It wears her out, it wears her out.
She lives with a broken man
A cracked polystyrene man
Who just crumbles and burns.
He used to do surgery
For girls in the eighties
But gravity always wins.
And It wears him out, it wears him out
It wears him out, it wears him out.
She looks like the real thing
She tastes like the real thing
My Fake Plastic Love.
But I can't help the feeling
I could blow through the ceiling
If I just turn and run
And It wears me out, it wears me out
It wears me out, it wears me out.
And if I could be who you wanted
If I could be who you wanted,
All the time, all the time, ohhh... ohh...
6.18.2007
Memória quase cheia
6.17.2007
Viver: essa arte fugaz
6.16.2007
Mistério
O mistério desliza em curvas invisíveis. Esguias e sinuosas. Traçando trajectórias nas esquinas. Réptil imóvel ao sol. Observa sem pestanejar. Ganhando formas na brisa, que se levanta, para logo desaparecer ao olhar.
6.15.2007
Porque não soube merecer
6.14.2007
Jealous guy
I was dreaming of the past
And my heart was beating fast
I began to lose control
I began to lose control
I didn't mean to hurt you
I'm sorry that I made you cry
I didn't mean to hurt you
I'm just a jealous guy
I was feeling insecure
You might not love me any more
I was shivering inside
I was shivering inside
I didn't mean to hurt you
I'm sorry that I made you cry
I didn't want to hurt you
I'm just a jealous guy
I was trying to catch your eyes
Thought that you were trying to hide
I was swallowing my pain
I was swallowing my pain
I didn't mean to hurt you
I'm sorry that I made you cry
I didn't mean to hurt you
I'm just a jealous guy
6.13.2007
6.12.2007
Florir em verso de seda branca
Que a minha boca tem pra te dizer!
São talhados em mármore de Paros
Cinzelados por mim pra te oferecer.
Têm dolências de veludos caros,
São como sedas brancas a arder...
Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que foram feitos para te endoidecer!
Mas, meu Amor, eu não tos digo ainda...
Que a boca da mulher é sempre mais linda
Se dentro guarda um verso que não diz!
Amo-te tanto! e nunca te beijei...
E, nesse beijo, Amor, que eu te não dei
Guardo os versos mais lindos que te fiz!
6.11.2007
Workout completed
I am addicted
«Beginning workout»
I've collected footsteps before dawn
Seen places I never knew existed
Ran to the moon and back
Being a Rabbit for the neighbourhood dogs
Obeyed the voice in my head
Let music carried me when I couldn’t
Raced against yesterday
Let the world be my witness
Measure myself in meters, kilometres, and finally, character
I plugged into a bigger propose
Let this world and came backed changed
«Workout completed»
I am addicted
Saio para correr como quem foge. Corro do mundo alcançando outros. Percorro espaços no tempo e os espaços do tempo. Numa viagem de curvas sinuosas. Sem percurso. Sem destino. Percorro memórias esquecidas, alcanço lugares que já não me lembrava. Que nunca conhecera. Incríveis. Lugares inimagináveis.
Corro até aos limites, num processo de observação acelerado, onde segundos parecem séculos e segredos se desvendam na magia envolvente da música, fiel companheira.
Não corro muitos quilómetros mas percorro distâncias inimagináveis. Cansado respiro fundo. Workout completed…
6.10.2007
Crash
A vida é um desenrolar de acidentes. Sucedem-lhe em catadupa, com mais ou menos amolgadelas. Graves, inofensivos, longos ou fugazes, por mais imperceptíveis, influenciam sempre um acontecimento futuro. Apenas indefinidos no tempo ou no espaço. Num contínuo misterioso de causa ou consequência.
É muito interessante tentar prever um acidente. O seu bater de asas de borboleta e terramoto associado.
6.09.2007
6.08.2007
Conheces todos os teus sentimentos?
Submergidos deste mundo num mar denso, olhámo-nos, por vezes, tão próximos. Na distância dum eco de búzio. Num silêncio tocante apurámos sentidos, trocámos segredos, levantámos pó de estrelas, cristalizando-os numa espécie de afectos, em sais. Frágeis, talvez. Mas intensos.
No nosso mergulho interior misturámos pedaços de céu com danças de lobos. Impacientes. Mantendo sempre o hiato de dois braços esticados, sem se tocarem. No entanto, sumo, perfume subtil e envolvente. Numa lava descendo o cume reservado do receio. Unindo, na sua passagem, pontos magnéticos. Invisíveis. Inexplicáveis.
Reservámo-nos um local desconhecido, repleto de sombras. Por inventar. Guiado por letras e sinais, construído na lentidão subtil da brisa, que chama sem se ouvir.
No silêncio submerso do nosso mundo que grita finas lâminas de inquietude nasceu uma ponte de neve. Branca ao olhar. Encurtando respostas às nossas dúvidas escorregadias.
Não tenhas medo de desvendar os murmúrios que nos chegam embrulhados, que cada um interpreta à sua maneira. Ouves?
Um bule de chá imaginário apita no vapor que podemos trocar de alma, por instantes. Sem porquês. Tenho a mão aberta pois talvez nos possamos ajudar. Conheces todos os teus sentimentos?
6.06.2007
Corpo
Pedro Paixão
Trepadeiras de dedos, cabelos, sexos, lábios misturam-se na dormência desordenada de sentidos. Sem regras. Sem destino. Apenas entrega à dança dos corpos.
Os corpos deitados no chão. Um corpo sempre descansa noutro corpo, embalado na magia do quente do corpo a dissipar-se, pouco a pouco. Na lentidão do tempo que desperta.
6.05.2007
A força do destino
6.04.2007
Multas 2 Paciência 0
6.03.2007
White light
6.02.2007
Teardrop on the fire
Love, love is a verb
Love is a doing word
Fearless on my breath
Gentle impulsion
Shakes me makes me lighter
Fearless on my breath
Teardrop on the fire
Fearless on my breath
Nine night of matter
Black flowers blossom
Fearless on my breath
Black flowers blossom
Fearless on my breath
Teardrop on the fire
Fearless on my breath
Water is my eye
Most faithful mirror
Fearless on my breath
Teardrop on the fire of a confession
Fearless on my breath
Most faithful mirror
Fearless on my breath
Teardrop on the fire
Fearless on my breath
Stumbling a little
Stumbling a little
Na tristeza ou alegria, saudade ou projecto futuro há sempre algo de mágico no fogo duma lareira...
6.01.2007
Amora morena
À medida que entravam um silêncio profundo entranhava-se nos ossos, protegido do exterior por espessas pedras alinhadas, corroidas pelo tempo. Os animais assustados recusaram entrar. Já a pé avançaram pequenos e observados por figuras gigantes de Deuses animais. Tudo parecia colocado a régua e esquadro, no local exacto, como se não existisse alternativa possível, na imensidão de hieróglifos espalhados pelas paredes.
Olhando em redor, abandonado pelos membros da equipa, que se concentravam num par de sarcófagos de tonalidade turquesa e dourada, presentia que o maior tesouro não estava ali. Sentia-o desde a chegada. Fechava os olhos e era como se voasse algo em seu redor. Beleza colorida em movimento, deixando um perfume indiscritível.
Abriu os olhos, de repente, com a passagem de um escaravelho que avançava lentamente, como que à sua espera. Seguiu-o, dirigindo-se para um recanto mais escuro, quase invisível ao olhar. À medida que se aproximava o aroma era cada vez mais intenso. Laivos de Sol ansiosos e uma tranquilidade de Nilo correndo para si.
Na total escuridão esticou a mão e sentiu uma folhagem alta. Invisível, de textura aveludada. Percorrendo-a numa caricia fecunda, parou num pequeno fruto carnudo. Ao arrancá-lo, trazendo-o para a luz, uma pequena amora morena surgia inocente mas sábia. Numa trajectória de astro colocou-a na boca. Ao trincá-la todo o templo estremeceu de cor. Deuses dançando aos ventos do Suão. Mil séculos de saberes ancestrais giraram num segundo. Sementes brotaram, nas margens férteis do Nilo e árvores cresceram em pássaros. Morte e nascimento de mãos entrelaçadas. Faraós e multidões de sentidos. Nunca sentidos.
Amora morena sabes-me bem. Tu tens um cheiro, que mais ninguém tem.