Pega a caneta e escreve. Derrama com ela o teu sangue - negro, espesso, denso - alastrando a tua sombra ou os teus raios de sol, pedaços da voz que te sussurra ao ouvido quando todos dormem. Impregnando o teu cheiro, o teu grito, a tua cor. Pouco a pouco, no silêncio branco da folha despida. Escreve-te nela, deixando-te embalar como uma viagem inacabada. Sem principio nem fim, apenas caminho, curvas. Sem medos, sem reservas, sem antes nem depois, sem enganos, sem aparências, sem rodeios. Como um deslizar de iceberg sem pressa, sabendo-se corroído aos poucos pelo tempo até se derreter um dia na imensidão do mar. Ora revolto na rapidez de um arrepio, ora deambulando algures no reflexo de uma palavra. Não conquistarás o mundo. Não esperarás nada de volta. Não conhecerás todos os lugares nem falarás todas as línguas. Não ficarás para contar. Libertarás apenas, talvez um pouco desse questionar das coisas, quando lhes batemos sem querer. Aparentemente óbvias ou menores, descobrindo-lhes encantos perdidos, esquecidos a alguns olhos moldados por demasiadas certezas. Pega na caneta e escreve. O que te apeteça, o que ela te exija.
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