Viajar por fotografias alheias. Tanta realidade aprisionada numa estética difusa e descomprometida. O mundo é tudo o que acontece mesmo o que não se viveu ou viverá, mesmo o que não se vê a olho nu, mesmo o que se inspira na manhã despida de gente. Tempos misturados, realidades e ficções, lado a lado, cruzando os braços ou evaporando-se num sopro, debotando-nos a alma num caderno de notas - não de escrita, de música oscilando no cheiro do café.
3.31.2011
3.27.2011
3.26.2011
Art
3.20.2011
Ser do sim
3.18.2011
Devagar
Levantar devagar. No espreguiçar dos gatos nas vidraças. Escrever dois textos curtos mas de horizonte largo. Tocar uma sonata de Schuman e fechar abruptamente o piano, de repente, libertando na sala o barulho de todas as notas numa só, colada às paredes. Acordar devagar como uma música que tudo revela a seu devido tempo, devagar. Olhar os pássaros no balançar dum ramo mais alto do que o que contem o olhar. Esticar o tacto num afiar de unhas, devagar. Passar a mão pelo relevo de um poema e sentir a cicatriz da sua voz a entranhar-se pelo corpo. Abrir a tua blusa, devagar. Tirar fotografias ao acaso para eternizar o nosso tempo. Viver devagar. Morrer, depressa.
3.12.2011
Metade
Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.
Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso
mas a outra metade é um vulcão.
Que o medo da solidão se afaste,
e que o convívio comigo mesmo se torne
ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Por que metade de mim é a lembrança do que fui
A outra metade eu não sei.
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Para me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.
Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer
Porque metade de mim é plateia
E a outra metade é canção.
E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.
Osvaldo Montenegro
3.05.2011
3.04.2011
Mel-and-Cia*
Uma coisa nunca é apenas o que é. Varia na forma e no lugar. Varia no tacto, no carinho e no que de nós lhe cunhamos. Varia na lentidão do tempo reservado e na palavra emprestada. Varia no olhar e nos olhos fechados. Varia no simples prazer da oferta, na reacção, no sorriso que ilumina as salas e no tocar dentro do escuro. Varia nos silêncios e na imaginação. Uma coisa nunca é apenas o que foi. Varia. Chega a ser o que ainda não foi. Chega a ser o que dela fica para sempre. Uma coisa nunca é apenas uma coisa só. Varia, nos teus lábios, nos teus gestos, na tua música por detrás de todas as coisas.
* Sementes e colheres variavelmente dispensáveis
3.02.2011
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