Nada. Ninguém. A sala despida de tudo. A TV desligada. Esquecida pela vontade de nada saber. De nada querer. Ausência de som. De movimento. Apenas um leve oscilar do cortinado. Uma dança imprevista. A textura polida dos objectos percorrida pela lenta passagem do olhar. Único viajante do corpo estendido. Entregue ao longo sofá. Cor de noite. Cor de manto denso.
Uma estranha solidão nadando nua no lago vasto da multidão. Dando à margem. Descansado. No búzio da minha escuta. Nada quero. Ninguém preciso. Nada. Ninguém. Ecos interiores assentando numa neve frágil. Difícil de agarrar. Derretendo rápido demais. Fazendo-se notar apenas num leve arrepio. Que teima em ficar.
Não saber o que quero. Não saber já nem o que não quero. Questionar. Não saber o que questionar. Vontade de adormecer ou partir. Mais um dia que passou. Tanto para fazer. Tanto para continuar. Descobrir a vontade no escuro. O telemóvel a tocar. Lembrando o mundo. Deixá-lo tocar até se esvair, também, no silêncio deste refúgio. Desta concha. Onde poucos entraram.
Todos parecem saber o que é suposto. Todos prescrevem receitas. Todos fazem demasiadas perguntas. Todos têm demasiadas certezas. Poucos percebem estas ausências. Poucos tocam com aquele simples abraço ou olhar. Morrer na noite anterior sem nada acusar na autópsia.
Músicas. Imagens. Memórias e pecados futuros. Todos em roda. De mãos dadas. Não sei se em sonho se realidade. Os teus olhos também. E a tua mão na minha perna. Contigo ao meu lado. Uma mão quente. Tão quente. Por todo o meu corpo.
Tempestades de lâminas afastam-te de repente. Não por minha vontade. Vindas do nada. Sem nexo. Sem fio condutor. Uma espécie de sol e chuva numa alternância aleatória. Sentir o choro de todos sem uma lágrima. Desastre. Acidente. Próximos. Tão próximos. Uma garrafa despercebida. Arrumada no bar. Desfocando dúvidas e certezas que passam no ar. Pairando ao redor. Preciso de espaço. Preciso de tempo. Preciso de ti.
Escrito há algum tempo atrás na pele de outra pessoa.
3 comentários:
Preciso de espaço. Preciso de tempo. Preciso de ti.
Lindo.
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Saber do que se precisa é meio caminho para ser saber o que se quer!
É um prazer ler-te...
beijinho
Gosto de martini e adorei ler-te! Vou voltar. Gosto da ideia de que existem homens a escrever bem ;)
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