6.14.2010

Tempo em que se morre

Agora é Verão, eu sei.
Tempo de facas, tempo
em que se perdem os anéis
as cobras à mingua de água.
Tempo em que se morre
de tanto olhar os barcos.

É no Verão, repito.
Estás sentada no terraço
e para ti correm todos os meus rios.
Entraste pelos espelhos:
mal respiras.
Vê-se bem que já não sabes respirar,
que terás de aprender com as abelhas.

Sobre os gerânios
te debruças lentamente.
Com o rumor de água
sonâmbula ou de arbusto decepado
dás-me a beber
um tempo assim ardente.

Pousas as mãos sobre o meu rosto,
e vais partir,
sem nada dizer,
pois só quiseste despertar em mim
a vocação do fogo ou do orvalho.

E devagar, sem te voltares
pelos espelhos entras na noite acesa.

Eugénio de Andrade

3 comentários:

Poetic Girl disse...

Bonito, adorei! bjs

Otário Tevez disse...

e do nosso terraço
podem-se ver muitos
outros terraços no verão.
boa semana!

[Ariana Aragão] disse...

Tempo em que se começa a querer viver.

Assíduos do shaker

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