se um dia a juventude voltasse
na pele das serpentes atravessaria toda a memóriacom a língua em teus cabelos dormiria no sossego
da noite transformada em pássaro de lume cortante
como a navalha de vidro que nos sinaliza a vida
sulcaria com as unhas o medo de te perder... eu
veleiro sem madrugadas nem promessas nem riqueza
apenas um vazio sem dimensão nas algibeiras
porque só aquele que nada possui e tudo partilhou
pode devassar a noite doutros corpos inocentes
sem se ferir no esplendor breve do amor
depois... mudaria de nome de casa de cidade de rio
de noite visitaria amigos que pouco dormem e têm gatos
mas aconteça o que tem de acontecer
não estou triste não tenho projectos nem ambições
guardo a fera que segrega a insónia e solta os ventos
espalho a saliva das visões pela demorada noite
onde deambula a melancolia lunar do corpo
mas se a juventude viesse novamente do fundo de mim
com suas raízes de escamas em forma de coração
e me chegasse à boca a sombra do rosto esquecido
pegaria sem hesitações no leme do frágil barco... eu
humilde e cansado piloto
que só de te sonhar me morro de aflição
Al Berto
4 comentários:
Gosto muito do que escreve, mas também gosto muito do seu dom para escolher as palavras dos outros que aqui deixa....
Xin Xin
Apenas coloco o que gosto, o que sinto [às vezes quase como meu],o que me toca. Com a vantagem de ser soberbamente melhor expresso [por quem tem realmente o dom da escrita]
XinXin
É tão lindo que até dói.
[o poema, claro...]
:)
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