Quando me falam no céu e no inferno lembro-me das ilhas Phi Phi e de Gaza. Lembro-me de um pai rodopiando no ar uma criança, a sorrir, e a de uma mãe a chorar, desesperada, sem comer para dar ao seu menino subnutrido, com olhos distantes, noutro local. Lembro-me de uma botija de oxigénio amarela. Viva, num mar repleto de peixes coloridos e esbatida na da sala de operações, entre batas cinzentonas. Lembro-me de entreajuda e de ganância. Lembro-me de médicos sem fronteiras e de teologias dogmáticas, presas às cadeiras. Obesas. Amorfas. Quando me falam no céu e no inferno lembro-me dum elevador parado, no rés-do-chão. Um elevador com duas portas, entreabertas. Lado a lado. Abertas à vontade do passageiro. Curiosamente no mesmo plano. No mesmo tempo. Curiosamente no mesmo espaço. Na mesma terra. O céu e o inferno vivem-se na terra. Vivem-se em vida, entre nós. Tudo o resto são meras conversas. Conversas de elevador.
1 comentário:
E como o céu e o inferno se vivem na terra, também é nesta «vida terrena» que conhecemos os pretensos deuses e os verdadeiros demónios...
;)
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