9.19.2007

O pedido impossível

Quero um filho teu. Sem compromissos ou exigências. Sem nada pedir em troca. Sem projectos ou futuro. Sem perguntas. Quero simplesmente um filho teu.

Era uma mulher perfeita, com uma força sobrenatural típica das grandes catástrofes. Sempre tivera o que entendera, num simples estalar de dedos. Os homens sempre tinham caído a seus pés como insectos atraídos pela luz. Embatendo num vidro intransponível. Autênticos bonecos, nas suas mãos esguias como cobras.

Sempre quisera, no entanto, ficar só, afastando-os, um a um, numa brusquidão seca e insensível. Tinha a beleza magnética dum felino. Indomável. Imprevisível. Inatingível.

Aquela frase permanecia na sua cabeça como um mistério. Numa crueza lisonjeira mas irónica. Porquê ele? Perguntava-se. Ele, que sentira o seu veneno a espalhar-se no corpo mas conseguira ficar totalmente imune. Talvez por isso, lhe tivesse permitido aproximar-se. Aos poucos, é certo. Quase a medo. Mas habituara-se.

Talvez ela, no fundo, sentisse que ele a compreendia, por detrás da sua espessa armadura. Talvez aprecia-se as suas críticas e conselhos, apesar de nunca os ouvir ou seguir.

Nunca mostrava a mais pequena fraqueza, mesmo para ele, que a conhecia tão bem e que aprendera a ler os seus códigos indecifráveis. Encriptados aos comuns observadores. Nunca lhe vira uma lágrima. Um suspiro. Uma neblina, mais ténue, no seu olhar quente e distante. Mas sabia sempre quando não estava bem ou se sentia só.

Talvez, com o avançar da idade, sentisse pela primeira vez, algo fugir-lhe. Querendo prolongar noutro corpo os seus segredos, refinando essa natureza felina ou corrigindo-a, de vez, extinguindo esses genes malévolos, essa revolta interior.

Ela que sempre dissera que quando quisesse um filho simplesmente o adoptaria queria agora um filho, e logo seu. Encontrara finalmente um objectivo duradouro? Quereria pela primeira vez amar de verdade?


To be continued

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