12.19.2006

Alma alfarrabista

"Eu sou do tamanho do que vejo não do tamanho da minha altura"

Alberto Caeiro


Passeava por entre os livros. Eram água para a sua sede desértica. Uma sede de conhecimento, de novos lugares, perspectivas, vivências. Tocava-os com um carinho paternal, protegendo-os, devorando-os no pavor do tempo a escorrer como areia pelas mãos. Amava-os em cada detalhe, do toque ao cheiro, no respirar da frase que acaba, em cada ondulação de corpo feminino.
Não percebia como podia haver quem os ignorasse ou trocasse e sentia uma pena profunda de quem não sabia ler ou não os podia ter. A custo, é certo, já se conseguira desprender da sua posse, preferindo tentar replicar nos outros a brisa de sensações que sempre lhe proporcionavam. Semeáva-os, deixava-os em locais públicos, estratégicos, estudados, observando quem lhes pegava e imaginando que janelas abririam noutro corpo diferente do seu. Apenas guardara um ou dois dos quais não se conseguia desfazer pois seria o mesmo retirar parte de si e, de quando em vez, quando as saudades apertavam visitava-os nas bibliotecas ou livrairas. Apenas o incomodava os que inevitavelmente ficariam por colher, por falta de tempo, conhecimento ou atenção, nesta vida fugaz que sempre será tema de livro incabado.

2 comentários:

Andrómeda disse...

Imagem belíssima e o texto é seu?

Se é, os meus parabéns, se não, mais uma vez foi uma escolha mágica.

Andrómeda

Dry-Martini disse...

Quando os textos não são meus tenho o cuidado de os identificar e sou apaixonado por coisas mágicas e pela magia de certas coisas :)

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